Introdução

 

Estima-se que, na época da fundação de São Paulo, em 1554, não mais de 100 habitantes viviam nos arredores do colégio erguido pelos padres jesuítas, constituindo o núcleo inicial da futura cidade. Nos três séculos seguintes, o povoado conheceu um lento crescimento, somente alterado a partir da década de 1870, quando o primeiro levantamento censitário realizado no Brasil, em 1872, apontou a presença de 31.385 moradores.


Assim, até o final do século XIX, São Paulo deixou para trás sua condição de vila afastada dos principais centros econômicos do país, sobretudo em razão de sua posição geográfica privilegiada, entre o porto de Santos e o interior da Província, onde se expandia o cultivo do café, passando então a assumir importância crescente como entreposto comercial e ponto de entroncamento das rotas pelas quais era exportada a produção cafeeira.


Nesta condição, passou a atrair um volume expressivo de trabalhadores e a fixar uma parcela significativa do fluxo de imigrantes europeus direcionado, inicialmente, para substituir a mão-de-obra escrava na lavoura cafeeira. Muitos desses imigrantes acabavam permanecendo na capital ou a ela retornavam após algum tempo.


Este fluxo imigratório perdurou nas duas primeiras décadas do século XX, o que manteve a cidade em elevado ritmo de crescimento demográfico. Durante este período, criaram-se as bases para o desenvolvimento industrial de São Paulo, com a transferência de capitais gerados na atividade agrária para as incipientes indústrias locais.


A transformação de São Paulo em importante centro industrial deu-se progressivamente, mas já era plenamente visível na década de 1920 − as manifestações artísticas do grupo Modernista em 1922 refletem bem este fato. O processo de industrialização no Brasil, centrado em São Paulo, muito beneficiou-se de dois eventos históricos de grande importância: a 1ª e a 2ª Guerras Mundiais, respectivamente ocorridas de 1914 a 1918 e de 1939 a 1945, períodos em que a retração do comércio mundial gerou a necessidade de substituição de importações, favorecendo a produção local de bens de consumo.


Por volta de 1950, já com os fluxos de imigração estrangeira bastante reduzidos e, ao mesmo tempo, em fase de grande impulso industrial, a cidade passou a atrair contingentes populacionais de outros Estados do Brasil, transformando-se então no maior pólo de migração interna. Foram mais de 3 milhões de pessoas – trabalhadores e suas famílias – que aqui chegaram  entre 1950 e 1980 e este processo, aliado ao crescimento vegetativo da população, manteve as altas taxas de crescimento da cidade no período (entre 4% e 5% ao ano).


Este quadro é bastante alterado, entretanto, a partir da década de 80, em decorrência tanto do processo de desconcentração industrial, que afetou a cidade a partir de meados dos anos 70 e redirecionou parte de suas instalações industriais para outras regiões do Estado de São Paulo e do país, quanto do processo de modernização tecnológica e gerencial, que suprimiu empregos no setor secundário da economia. A cidade teve então reduzido seu poder de atração populacional, passando a apresentar saldos migratórios negativos. Ainda na década de 80, o crescimento vegetativo também sofreu um arrefecimento, em decorrência da diminuição dos índices de fertilidade e de natalidade na população brasileira.


Tudo isso contribuiu para a redução acentuada da taxa de crescimento demográfico para patamares muito menores que aqueles apresentados nos 100 anos anteriores, chegando a índices em torno de 1,2% ao ano. Em outras palavras, se a aglomeração urbana continuou a crescer em seu conjunto, isto deveu-se à expansão das áreas periféricas do município de São Paulo (incluindo aquelas situadas em zonas de proteção a mananciais) e ao crescimento que ainda se observa em grande parte dos municípios da sua região metropolitana.


Esta nova dinâmica intensificou-se de tal forma que, desde a década de 90, o aumento populacional da cidade tem-se pautado por um lento crescimento vegetativo, aliado a saldos migratórios totais negativos − é maior o número de pessoas que se mudam para fora de São Paulo do que as que vêm para aqui se estabelecer −, o que resulta em taxas médias de crescimento menores que 1% ao ano.


São Paulo, maior cidade do Brasil desde a década de 60, é hoje o mais poderoso pólo de atividades terciárias do país e sua população se aproxima da cifra dos 11 milhões de habitantes, distribuídos pelos 1.509 km2  de seu município, que se divide em 31 subprefeituras e estas, em 96 distritos. São Paulo também é o centro da região metropolitana de mesmo nome, que, com seus 19 milhões de habitantes, ocupa a 4ª posição no ranking das  maiores aglomerações urbanas do mundo. São 39 municípios, incluindo o da capital, 8.051km2 e uma mancha urbana contínua que, no sentido leste-oeste, apresenta cerca de 100 km de extensão.


A população de São Paulo apresenta algumas especificidades em termos demográficos e urbanos, entre as quais merecem destaque certos aspectos de gênero e idade, assim como de sua distribuição territorial.


De fato, seguindo o padrão encontrado em grandes áreas urbanas, a população do município de São Paulo vem sofrendo um processo de “feminilização”, ou seja, ao longo dos anos tem sido crescente a predominância numérica de mulheres no conjunto da população. Dados do Censo de 1980 indicam, naquela data, uma proporção de 96 homens para cada 100 mulheres residentes no município. Em 2000, essa relação já era de 91 para 100 e estima-se que, atualmente, esteja em torno de 90, ou seja, existem 9 homens para cada 10 mulheres na cidade. Vale ressaltar que esta “razão entre os sexos” varia em função dos grupos etários, sendo mais discrepante nas idades mais avançadas: a partir dos 60 anos, em razão da longevidade feminina, a proporção encontrada é de 6,8 homens para cada 10 mulheres.
Simultaneamente ao fenômeno de “feminilização”, verifica-se a ocorrência de um processo de “envelhecimento” desta mesma população, que se traduz na redução da participação de grupos etários mais jovens em relação aos adultos e velhos. Em 1980, o grupo de 0 a 14 anos de idade representava 30% do total de residentes e, 20 anos depois, esta participação caiu para 25%, apontando uma tendência que deve se intensificar nas próximas décadas. Inversamente, a faixa etária de 60 anos e mais, que em 1980 correspondia a 6% da população, teve sua representatividade aumentada para mais de 9% em 2000.


O “índice de envelhecimento” é um indicador importante, uma vez que estabelece a proporção de idosos em relação ao total de crianças numa determinada população. Na cidade de São Paulo, em 1991, havia em média 18 idosos para cada grupo de 100 crianças, aumentando para 25 por 100 em 2000. Esta proporção varia em função tanto do sexo (é sempre maior no caso das mulheres) como da localização da população na cidade − é mais elevada em regiões de urbanização consolidada do que em áreas periféricas, justamente devido à maior presença de crianças nessas regiões. Credita-se o processo de envelhecimento, sobretudo, à queda de fecundidade, já apontada, e aos progressos da medicina preventiva e curativa que, pela expansão dos serviços de saúde, acabaram por aumentar a expectativa de vida da população.
Um outro importante processo a ser destacado refere-se a alterações na dinâmica de ocupação urbana e de distribuição da população no território municipal. Até a década de 80, todas as regiões da cidade apresentavam crescimento positivo, com exceção de um núcleo muito central formado pelos distritos de Belém, Bom Retiro, Brás e Pari. A partir de então, a tendência à redução do número de habitantes espraiou-se para áreas adjacentes, fazendo com que o núcleo central e outros distritos de ocupação já consolidada viessem a apresentar taxas negativas de crescimento, incluindo áreas da zona leste mais próximas ao centro da cidade e partes das regiões norte, oeste e sul, formando uma mancha em contínua expansão.


Durante a década de 90, esse processo intensificou-se, numérica e espacialmente, quando aproximadamente 60% dos distritos do município passaram a apresentar perda populacional. Neste período, o conjunto de distritos que continuaram a registrar crescimento positivo foram aqueles situados nas áreas mais extremas da cidade, a maior parte limítrofes com outros municípios da região metropolitana, indicando que o processo de periferização ultrapassou os limites de São Paulo, em direção às cidades de seu entorno.
Entre os fatores que certamente contribuíram para este espraiamento da ocupação urbana e para a mudança no padrão de crescimento demográfico no município, merecem destaque: a continuidade do processo de desconcentração industrial em direção a outros municípios da Região Metropolitana de São Paulo e interior do Estado; o alto custo de vida na capital (sobretudo no que se refere à habitação); e a expansão de atividades terciárias nas áreas mais consolidadas do centro urbano, substituindo o uso residencial de muitas áreas pelo uso comercial e de serviços.


As três características citadas anteriormente – feminilização, envelhecimento e periferização da população – merecem atenção especial de todos aqueles que se dedicam à formulação de políticas públicas, pois, a médio e longo prazos, terão importância decisiva na definição do perfil e distribuição dos habitantes de nossa cidade.